Eu simplesmente fiquei apaixonada por este livro. Ele não chega a ser uma biografia de Churchill, mas, se assim podemos definir, trata-se de uma “biografia da filosofia” por trás do pensamento de Winston Churchill. Eu fiquei muito emocionada com o texto escrito pelo seu bisneto Jonathan Sandys, e pelo ex-funcionário da Casa Branca Wallace Henley. Publicado no Brasil em 2017, pela editora Novo Século, a obra é uma pesquisa profunda sobre o que moveu o homem, considerado o principal nome do século XX, a tomar as atitudes que tomou durante a Segunda Guerra Mundial e conseguir livrar o planeta de afundar na obscuridade promovida pela doutrina nazista. Deus e Churchill: Como os propósitos divinos marcaram a vida desse grande líder e a história é um livro para quem gosta de entender melhor o que está por trás das mentes dos grandes líderes da história, o que os motivava e as mais profundas marcas na alma que estes homens levaram consigo até o fim de seus dias.
Estou tendo o máximo de cuidado ao redigir esta resenha porque
gostaria, muito sinceramente, que os leitores pudessem se interessar pelo livro
sem que eu o estrague construindo um texto sem empolgação – da qual fiquei
refém durante quase toda a leitura da obra. Há certas coisas, certas linhas de
pensamento, que não têm uma explicação racional quando ditas ou pensadas, mas
que simplesmente, tempos depois, acontecem com o máximo de realidade possível.
Com apenas 16 anos, em 1891, o menino Winston Churchill disse ao seu amigo o
seguinte: “De alguma maneira, este país será submetido a uma tremenda invasão;
por quais meios não sei, mas digo-lhe que estarei no comando das defesas de
Londres, e salvarei Londres e a Inglaterra do desastre”. Ouvir aquilo em 1891
pareceu cômico aos ouvidos do amigo que nem sonhava com as duas grandes
guerras.
Filho da aristocracia britânica, com um pai mulherengo e ausente,
e uma mãe com histórico de envolvimento com vários homens – distante física e
emocionalmente do menino –, Winston logo foi matriculado em um internato, do
qual enviara inúmeras cartas, não respondidas, para a sua mãe. Extremamente sozinho,
consolou-se ao lado da sua babá, que não pode nunca ter seu nome esquecido na
história: a senhora Elizabeth Ann Everest. Dona Everest era uma cristã
autêntica, muito dedicada à leitura da Bíblia e que ensinou o pequeno Winston a
amar as histórias bíblicas e a desenvolver o caráter e a visão de mundo com
olhar cristão.
No início de sua juventude, aquele que viria a ser o “mais improvável”
primeiro-ministro britânico ingressou na Marinha da Inglaterra, fez carreira e
chegou ao Almirantado. Teve experiências em guerras, na verdade foram quatro, até
aos 25 anos. Ele esteve na Guerra dos Bôeres, na África do Sul, quando se
tornou prisioneiro, mas ganhou destaque por ajudar a salvar vários soldados
ingleses e por conseguir fugir em segurança. Sua cabeça esteve a prêmio, mas
conseguiu escapar. Foi recebido em seu país como herói. Mas nem tudo foram
flores eu sua carreira militar, houve uma derrota terrível durante a Primeira
Guerra Mundial e seu nome, quando não esquecido, foi tratado de maneira jocosa.
Historiadores mais recentes descrevem Churchill como sendo
ateísta ou agnóstico, mas os autores do livro discordam que ele tenha
permanecido com a sua visão agnóstica da juventude, pois em inúmeros discursos
e textos ele evidenciava a certeza da existência de Deus e da Sua Providência,
coisa que agnósticos não admitem. Ele se referia ao Sermão da Montanha como a “palavra
final em ética” e reiteradas vezes afirmava que defenderia até o fim a civilização
cristã ocidental. Ele era um profundo admirador do líder Moisés e escreveu
sobre ele algumas vezes. “Aqui Moisés recebeu de Jeová as tábuas dessas leis
fundamentais que deveriam ser seguidas, com lapsos ocasionais, pelas figuras
mais nobres da sociedade humana”, escreveu Churchill. Disse ainda que as
comunidades nômades dos hebreus, vagando pelo deserto, “adotaram e proclamaram
uma ideia que toda a sabedoria da Grécia e todo o poder de Roma foram incapazes”.
Ele ainda disse mais, que o Senhor dessa esplêndida sociedade, é “o único Deus,
um Deus universal, um Deus das nações” [...] “Um Deus não só de justiça, mas de
misericórdia; um Deus não só de autoproteção e perenidade, mas de compaixão,
sacrifício pessoal e inefável amor”. Os autores do livro deixam claro que
Churchill nunca foi um homem religioso, não frequentava igreja, mas sempre lia
a Bíblia e, em seus discursos, citava trechos bíblicos e defendia a conservação
das raízes judaico-cristãs da sociedade ocidental. A foto de Elizabeth Everest,
sua babá, permaneceu na parede da sala de Churchill até o seu falecimento, aos
90 anos de idade. Um homem que pensa sobre um “Deus de misericórdia e inefável
amor” é impossível ter uma visão agnóstica de vida.
Darrel Holley, eu seu livro “Churchill’s Literary Allusions”,
escrito em 1987 e citado pelos autores do livro – do qual escrevo esta resenha –,
afirma que a bíblia na versão do rei James constituiu a “principal fonte de
ilustrações interessantes, quadros descritivos e frases inspiradoras de
Churchill”. Fala ainda: “Seu conhecimento da Bíblia se manifesta em citações
diretas, em relatos parafraseados de histórias bíblicas e em seus frequentes, e
talvez inconscientes, usos de termos e frases bíblicos. [...] Para ele, é a magnum
opus da civilização ocidental”.
Churchill se referia à história de Moisés como uma história
literal das Escrituras. Em seu ensaio “Moses: The Leader of a People” [Moisés:
o líder de um povo], ele deixa isso muito claro e sem ambiguidades: “Acreditamos
que uma visão mais científica, uma concepção mais atualizada e racional, será
plenamente satisfeita considerando-se a história da Bíblia como modo literal, e
identificando um dos maiores seres humanos [Moisés] com o mais decisivo avanço jamais
visto da história humana. [...] Podemos ter certeza de que todas aquelas coisas
aconteceram exatamente como registradas nas Sagradas Escrituras”.
Mas o livro não é apenas interessante por descreve o que motivava
as ações de Churchill, mas também descreve as motivações de Hitler e mostra
como a sociedade britânica, naquela época, já estava mergulhada na filosofia
nazista, que se espalhava gradativamente por toda a Europa. O livro relata que
tanto Winston Churchill como seu pai eram mal vistos na aristocracia britânica
por terem em suas rodas de amigos pessoas judias. A obra mostra também o flerte
que uma das filhas de Churchill teve com a filosofia nazista e como esse
pensamento já estava enraizado na mente de boa parte dos europeus, bem antes do
início da Segunda Guerra.
O livro vai tratar também da decadência da igreja alemã e vai
mostrar a luta de alguns líderes protestantes e católicos contra a “nova igreja
nazista” da Alemanha. Um dado que era desconhecido para mim: mais de mil
pastores protestantes e padres católicos foram mortos no campo de concentração
em Dachau – primeiro desses campos nazistas – antes e durante a Segunda Guerra
Mundial, por não se dobrarem ao pensamento nazista de mudança de filosofia da
igreja.
“Hitler sabia que em algum momento teria de fazer com os
cristãos o que estava fazendo com os judeus. Os pastores combativos do que era
conhecido como Igreja Confessional o desafiaram e ousaram pregar contra o
nazismo até que fossem levados. Ao final, ele precisaria se livrar por completo
dos cristãos, mas primeiro iria cooptar a igreja oficial alemã e torná-la serva
da ideologia nazista e legitimadora de suas crueldades” (página 228).
Os autores do livro destacam que a maior parte da igreja da
Alemanha se corrompeu doutrinariamente porque a teologia já estava corrompida há
mais de um século – com o advento da Teologia Liberal e do método
interpretativo das Escrituras que tirava todo o poder transcendente dela. Esse
pensamento estava destruindo a igreja cristã, não apenas na Alemanha. Com
raízes enfraquecidas, essa igreja facilmente cedeu à “nova teologia nazista”. Os
escritores também destacam o que estava por trás da filosofia de vida de Hitler,
que já havia escrito que o cristianismo era uma “religião de gente fraca” e que
deveria ser exterminado. Hitler tinha repugnância à cosmovisão cristã de vida,
pensamento completamente contrário ao de Winston Churchill. Uma das cenas
impactantes do livro é a parte da descrição, por um médico nazista chamado H.
Fischer-Hüllstrung, do enforcamento do pastor Dietrich Bonhoeffer:
“Vi o pastor Bonhoeffer... ajoelhado no chão orando com todo
fervor para o seu Deus. Fiquei profundamente comovido com a forma como aquele
homem amável e incomum orou, tão devoto e tão certo de que Deus ouvia a oração.
No local de execução, mais uma vez ele fez uma breve oração, e então subiu os
degraus até a forca, com coragem e compostura. Morreu passados alguns segundos.
Nos quase cinquenta anos que trabalhei como médico, nunca vi um homem morrer
tão plenamente submisso à vontade de Deus”.
Há muitas informações preciosas neste livro e que se fosse
para elencá-las todas aqui, acabaria por fazer uma cópia do texto do Jonathan
Sandys e do Wallace Henley. Há descrição também do relato de um amigo de Hitler
na época da adolescência, afirmando que o líder nazista, desde muito cedo, já
sabia que tinha um “chamado” quase “divino” para realizar uma “grande obra” na
civilização. O livro mostra quais eram os pensadores nos quais Hitler baseava
sua conduta e se direcionava para realizar suas ações. Cita filósofos
ocultistas e expõe nomes como Helena Blavatsky – cofundadora da Sociedade
Teosófica – como mentores dos atos de Hitler. É explicado também por que
Richard Wagner era músico querido deste líder alemão e mostra que o genro de
Wagner (que odiava o cristianismo) era primo do ex-primeiro-ministro Neville
Chamberlain – responsável pelo atraso das Forças Armadas britânicas e quase
desastre da Segunda Guerra Mundial.
O livro é uma preciosidade, pois trata-se de uma pesquisa
profunda, sem rodeios, sem esconder as partes ruins e expondo, de uma vez por
todas, quais filosofias estavam em cena na época da II GM e no que o mundo se
transformaria se a Alemanha tivesse vencido o confronto. Termino com as palavras
de Boris Johnson, ex-prefeito de Londres e ex-primeiro-ministro britânico,
também biógrafo de Winston Churchill, citado pelos autores do livro ao qual
pertence a presente resenha:
“Se tirarmos Churchill da equação... deixamos o destino da Grã-Bretanha
e do mundo nas mãos de Halifax [o que precederia Chamberlain depois de sua
renúncia, mas não aceitou o cargo que acabou caindo no colo de Churchill],
Chamberlain e dos representantes dos partidos Trabalhista e Liberal. Eles
teriam negociado com Hitler, como Ministro das Relações Exteriores estava
propondo? Parece esmagadoramente provável... Foi Churchill – e apenas Churchill
– que tinha feito da resistência aos nazistas sua missão política... Se você acabasse
com a resistência britânica em 1940, estariam criadas as condições para um
desastre irreversível na Europa”, escreveu em seu livro “O fator Churchill”.
“Deus e Churchill: Como os propósitos divinos
marcaram a vida desse grande líder e a história” vale
muito a pena ser lido, meditado e avaliado.
Ficha técnica
Obra: Deus e Churchill: Como os propósitos divinos
marcaram a vida desse grande líder e a história
Autor: Jonathan Sandys e Wallace Henley
Editora: Novo Século
Páginas: 352
Ano: 2018
Comentários
Postar um comentário
Obrigada por passar por aqui! É uma honra ter sua opinião.